segunda-feira, 20 de abril de 2015

Festa de São Benedito na Achiropita

Dia 19 de abril de 2015 foi um dia muito especial na comunidade da Achiropita, no bairro do Bixiga. Comemorou-se a Festa de São Benedito com a presença de muitos convidados, dentre os quais a velha guarda da escola de Samba Vai Vai,  membros da escola de samba Unidos do Peruche, Congada de São Benedito, da cidade de Cotia, a Congada de Mogi das Cruzes, da mestre Laine, única mestre mulher do estado de São Paulo, além de membros da pastoral afro, dentre outros. As congadas fizeram uma linda apresentação na rua, depois todos os grupos entraram na igreja da Achiropita, onde o padre recebeu a todos com muita alegria e carinho. Foi uma festa muito bonita, mostrando de fato um sincretismo cultural e respeito pelas diversas culturas presentes. Foi uma celebração repleta de canções e momentos emocionantes. Uma oportunidade única de ter contato com estas ricas culturas que compõem a cultura popular brasileira.





sábado, 18 de abril de 2015

Samba Paulista no Centro de Pesquisa e Formação - SESC

No dia 09 de abril, deu-se início um ciclo de palestras sobre a história do samba paulista, trazendo manifestações que influenciaram de alguma maneira na concepção do que conhecemos por samba, influenciando no ritmo, nas composições, na instrumentação, dentre outros aspectos.
O ciclo foi aberto com congada e moçambique. A representante da congada foi a Mestre Gislaine Donizeti, da Congada Santa Ifigênia, de Mogi das Cruzes. É a única mestre mulher no estado de São Paulo. Esta congada tem cerca de 40 pessoas, eles trabalham com 3 ritmos: dobrado, marcha picada e marcha lenta.
No Brasil colônia, para que os negros pudessem realizar suas manifestações, foram criadas as Irmandades Negras, que normalmente eram confrarias ligadas a São Benedito, Santa Ifigênia e Nossa Senhora do Rosário. A congada fazia parte da celebração ligada às confrarias.O maracatu também pode ser considerado uma congada no contexto de carnaval.
O beijamento da bandeira é algo muito importante dentro dos grupos de congada, é um momento sagrado, de respeito, de ligação com o divino. Ainda hoje, durante as festas religiosas, onde há participação de congadas, ocorre de alguns padres fecharem a porta da igreja para que os grupos não entrem, denotando um desconhecimento sobre nossas raízes culturais e ressaltando um modelo imposto pelo Vaticano, uma certa romanização de nossos padres, como lá não existe congada, esta diretriz é desconhecida, logo o que é desconhecido é errado.
O moçambique foi representado pelo Mestre Silvio Antônio de Oliveira, do grupo Cambaiá-Cia, de Moçambique de São Benedito, da região do Vale do Paraíba. Ele relatou que o moçambique possui vários tipos de manejos com os bastões e se baseia muito na epopéia de Carlos Magno e os 12 Pares de França, na luta entre mouros e cristãos. Um dos elementos identitários do moçambique é a gunga, um tipo de chocalho utilizado no pé dos dançantes. Esta influência é africana, por lá também se encontram estes tipos de chocalho.
Nestas manifestações, antes da dança em si, há um trecho conhecido por embaixada, que se constitui em encenação do confronto entre cristãos e mouros, assim depois da guerra vem as danças, onde muitas das coreografias são baseadas em danças de origem europeia. Há também a forma de cantar conhecida por canto responsorial, que é uma forma africana, onde uma pessoa puxa e outro responde com um texto que é uma continuidade. Os primeiros blocos carnavalescos em São Paulo utilizavam o canto responsorial. A instrumentação composta por bumbos, caixas, influenciaram de sobremaneira o samba.
No dia 14 de abril foi a vez da catira adentrar o ciclo do Samba. Há linhas de pesquisa que apontam 3 linhas para origem da catira: matriz tupi: dança indígena, forma circular, ritmo marcado pela batida dos pés e cantos/ matriz lusitana: usavam música para catequização dos indígenas, os encantavam através do uso da viola/ matriz africana: tribos bantu de Angola e Moçambique, percussão.
A catira desenvolve um sapateado brasileiro livre, executado com "bate pé" ao som de palmas e violas. Era uma dança somente de homens, hoje já temos mulheres dançando. A dança se desenvolve em duas filas, onde os primeiros desta fila são chamados "palmeiros" ou "puxadores de palma", eles se localizam próximos aos violeiros. A música executada ao vivo, por violeiros, são modas de viola, normalmente com temática de boiadeiros e lavradores, anedotário caipira, histórias de amor. É uma manifestação passada de geração em geração, dentro de famílias, todavia a pesquisadora Caroline de Miranda Borges e o pesquisador e dançador de catira Fernando Basso, integrante do grupo Catira Brasil, desenvolveram um projeto para ensinar catira nas escolas no interior de São Paulo.
No dia 16 de abril, foi o dia do jongo, representado pelo mestre Gil, do jongo de Piquete; samba de bumbo representado pelo Mestre Agenor, de Valinhos; batuque de umbigada, representado pelo mestre Vanderlei do Batuque de Umbigada de Piracicaba. Estas manifestações se desenvolveram de sobremaneira na região do Rio Tietê, onde havia muitas fazendas de café, na qual os escravizados depois da labuta, se reuniam para dançar. O jongo tem como característica marcante as músicas de linguagem cifrada, onde normalmente há "um recado" embutido nas canções, como mestre Gil citou uma canção que diz:
"Lá em casa tem um boi
com uma ferida no pé
Todo mundo quer a carne
mas a ferida ninguém quer"
Esta canção pode querer dizer muitas coisas, como pode ser um pai cantando na roda, que em casa ele tem uma filha, grávida, que todo mundo quer a filha, mas a criança ninguém quer. O jongo tem também as cantorias de louvação, a santos católicos, santos da religião negra; cantos de visaria (cantos para riso); cantos de demanda: um fala e outro responde.
O mestre Vanderlei, do Batuque de Umbigada, disse que as festas são sempre abertas pelos mais velhos, pois é um diálogo com a ancestralidade. Na tradição bantu, umbigo representa a nossa primeira boca, primeiro contato com o mundo externo, dar umbigada na roda é como se fosse uma ode ao dom da concepção e não algo erótico, conforme muitos pensam.
O samba de batuque do mestre Agenor é mais conhecido por Samba de Roda Dona Aurora. Há um bumbo chamado 7 légua, porque o som dele se escuta muito longe, é lavado com pinga uns dois antes de haver o samba. Outros instrumentos presentes são: bumbo pequeno, guaiá, caixinha.
O encontro do dia 28 de abril foi com seu Carlão do Peruche, já no alto dos seus 80 e algo mais, lembrou-se de canções do tempo de menino, onde seu pai o levava para ver o jongo em Pirapora do Bom Jesus:
"Ô Pirapora
 Ô Bariri
quem tem dinheiro vai
quem não tem que fique aí"
Bariri no caso era a cidade de Barueri. Pai e filho sempre iam aos encontros que aconteciam na cidade para a festa do santo, mas seu Carlão confessou que veio conhecer a igreja quando já era avô, logo entende-se que o negócio era mesmo a festa que os negros faziam, que trazia gente de muitas partes deste Brasil, principalmente gente do sul de Minas Gerais e do interior de São Paulo. Madrinha Eunice, fundadora da primeira escola de samba da cidade, a Lavapés, foi uma grande jongueira. Seu Carlão começou em uma escola de samba que ficava no Bosque da Saúde, mas logo em seguida foi para Lavapés. Tocou vários instrumentos, dentre os quais o tamborim, que na época era quadrado, feito de pele animal. Como naquela época, a cidade de São Paulo era de fato "a terra da garoa", quando havia o desfile, o pessoal saia com os bolsos cheios de jornal, pois se chovesse, o tamborim desafinava e aí pegava-se o jornal para colocar fogo e assim aquecer a pele do instrumento. Foi um período áureo da Lavapés, com muitos títulos, muitas confusões também, que culminaram na saída de seu Carlão e muitos que o acompanhavam para fundar a Unidos do Peruche em 04 de janeiro de 1956. Segundo seu fundador, a Peruche foi a primeira escola a ter um barracão para ensaio, já que todas ensaiavam nas ruas. Com um material humano de excelente qualidade, a escola ganhou vários campeonatos, desde seu início. Na administração do prefeito Faria Lima, ocorreu a formação da Federação de Escolas de Samba na cidade de São Paulo, seguindo os moldes do carnaval carioca, assim o carnaval paulista perde seus blocos e cordões e muitas características do chamado "samba rural paulista", como a cadência mais devagar, a "batida" grave.
O ciclo do samba chegou ao final no dia 30 de abril com a fala de uma figura importante no samba paulista: Osvaldinho da Cuíca, que foi falar deste samba no cotidiano, este samba que acontecia nas esquinas da cidade de São Paulo. Osvaldinho nasceu ouvindo samba e desde cedo começou a batucar na caixa de engraxate, trabalhando e tocando nas ruas da metrópole. Nesta época, algo muito interessante que acontecia era a Tiririca que consta de um jogo de pernada inspirado na capoeira, era como se fosse uma "capoeira sambada". O objetivo da tiririca era a brincadeira, mas quando havia o encontro de grupos inimigos, aí a coisa ficava feia, era pernada para todo o lado e navalha, pois neste período o pessoal tinha o costume de andar com navalha escondida na braguilha da calça, no caso os homens e as mulheres com ela escondida na unha. Foi integrante do teatro popular Solano Trindade, onde aprendeu mais coisas da cultura afro. Sempre foi um compositor muito atento ao que acontecia ao seu redor e sempre muito criativo. Osvaldinho coloca que isto hoje está em falta, não há criatividade, as pessoas só copiam umas das outras, o samba perdeu este local fomentador de ideias, bem como sua mística e devoção. Ele colocou também que o samba paulista tem muita influência das festas do divino, no uso do bumbo, que há princípio, os cordões da cidade tocavam bumbo com duas baquetas, uma influência bem forte destas festas, além de outro instrumento característico, que era a frigideira.
A grande maioria das escolas de samba da cidade surgiram a partir do futebol de várzea, onde no princípio eram os cordões, característicos do samba em São Paulo, chegam a ter até 1800 pessoas, receberam este nome pois havia uma corda lateral para conter as pessoas. À frente do cordão vinham Rei, Rainha, baliza, contra baliza, toda a corte e o estandarte, não tinha enredo, bem como alegoria, característica marcante das escolas de samba.