domingo, 23 de novembro de 2014

Vivência de Samba Lenço com Raquel Trindade

No dia 22 de novembro, fui à Embu das Artes, juntamente com o pessoal do curso sobre a história do Samba promovido pelo CPF (Centro de Pesquisa e Formação), pertencente ao SESC. Fomos a esta cidade para conhecer o Teatro Popular Solano Trindade, que é administrado pela família Trindade, na figura da matriarca Raquel Trindade, filha mais velha de Solano Trindade. Este recifense foi cineasta, poeta, folclorista, teatrólogo, ator, morreu na década de 70, mas deixou um legado artístico que perdura até os dias atuais. Dona Raquel Trindade, uma artista multifacetada, funda o teatro no ano de 1975 e também em Embu funda a Nação Kambinda de Maracatu. No ano de 1985 cria um curso de extensão sobre folclore, teatro negro e sincretismo religioso na UNICAMP. Hoje, com 78 anos, ainda ministra cursos, dança, pinta, enfim, faz muita coisa em prol da manutenção desta cultura negra e do legado familiar. Nos recebeu com muito amor, carinho e ternura para uma vivência de Samba Lenço Rural, como a mesma designou. Ela começou nos contando um pouco sobre a história do samba em São Paulo e que este samba lenço era muito característico dos negros que trabalhavam na lavoura, por isto a postura do corpo mais abaixada, o uso do lenço, pois as mulheres usavam o mesmo na cabeça para proteger-se do sol e um cantar forte, altivo, típico dos cantos de trabalho. Claro que foi muito divertido e que não conseguimos obter muito sucesso nesta empreitada, já que nascemos em uma outra realidade e não estávamos acostumados a tudo, mas foi incrível a troca de energia e alegria que foram despertados no ambiente. Depois, fomos a casa de dona Raquel, que queria nos mostrar alguns de seus desenhos, livros. Foi uma manhã inesquecível, e uma das canções cantadas durante a atividade chamou-me a atenção para a questão do quanto os negros eram perseguidos e resistiram bravamente e nos deleitam com manifestações belas de cultura popular. A letra da música é:

Dona Luzia é uma negra boa
Ela faz um samba
Lá na casa da patroa
Mas eu não vou neste samba com você
Por que?
Porque a polícia tá querendo me prender

Obrigada dona Raquel Trindade e a todo pessoal pela generosidade e carinho que nos receberam!







segunda-feira, 17 de novembro de 2014

História do Samba Paulista - Olga Rodrigues de Moraes Von Simson

Na quarta-feira, dia 12 de novembro, fui ao Centro de Pesquisa e Formação do SESC para assistir a interessante explanação da professora Olga Von Simson, socióloga e pesquisadora da história do samba paulista. Sua palestra trouxe elementos muito interessantes sobre esta história, dentre os quais a influência da dança dos caiapó, do cateretê, da catira e do jongo na constituição do samba paulista. A professora fez entrevista com vários "bambas" do samba, dentre os quais Dionísio Barbosa, Geraldo Filme visando fazer a reconstituição desta história. O carnaval paulista até a década de 1970 é marcado pelos cordões, com a instituição de regulamento ao carnaval paulistano, baseado no regulamento carioca, os cordões tiveram que se transformar em escolas de samba e perderam o elo com o samba vindo da zona rural, do Vale do Paraíba, os batuques de influência negra, a umbigada que era oriunda do "semba", dança tribal da região de Angola feita para homenagear a deusa da fertilidade, responsável por uma colheita farta e muitos filhos para ajudar nos trabalhos e nas guerras. As entrevistas realizadas para este trabalho estão disponível no MIS e no Centro de Memória da Unicamp.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Registros fonográficos com o Samba Lenço de Mauá

Sábado, dia 08 de novembro de 2014, eu e Amanda Martins, minha irmã de alma, cumprimos mais uma etapa de nosso trabalho: gravação em estúdio com o grupo Samba Lenço de Mauá.  Desta vez, tivemos a companhia mais que especial da professora Andrea Paula dos Santos, docente da Universidade Federal do Grande ABC, que está nos auxiliando grandemente nesta jornada pelo mundo da escrita. Nos encontramos na estação de trem Mauá e fomos rumo a casa de dona Ana Rosa (filha do seu João, um dos fundadores do grupo) para irmos juntos ao estúdio, em um ônibus fretado para o grupo. Chegando lá no Jardim Zaíra II, estava a dona da casa e a sobrinha Fabiana, também integrante do grupo, que carregou os instrumentos para o ônibus e saímos para o Jardim Zaíra VI para buscar o restante do pessoal que iria para o estúdio. Somente o pessoal que toca e também canta foi para a gravação, juntamente com a Claudete, a puxadora dos sambas. Todavia duas figuras importantes que não se encaixam neste perfil também foram: dona Ana Rosa e dona Braulina, que são integrantes muito antigas do grupo, pessoas de referência para o pessoal. Todo mundo no ônibus, rumamos para São Bernardo do Campo, para o estúdio Baeta. Chegando lá, já estava o seu Kinkas, membro do grupo e coordenador do mesmo. O pessoal retirou os instrumentos e a 7 léguas (tipo uma zabumba), a campanha e o manhoso (também instrumentos de percussão de pele) foram afinados do lado de fora, em um ritual que já vem desde os primórdios do grupo: aguardente é jogada sobre os instrumentos, na pele e nas laterais, para apertar aos poucos a pele. Cada instrumento representa um orixá, a bebida simboliza o oferecimento a este orixá.
Terminada esta etapa, entrada no aquário para gravação, ajusta microfone de voz, microfone de instrumento, todos muito ansiosos e até mesmo um pouco tensos com a situação, mas tudo correu muito bem, interessante notar que a puxadora, a Claudete, ao final da gravação disse que estava preocupada com a maneira de cantar, disse que tentou falar as palavras com o português mais correto possível para que as pessoas possam entender as canções. Achei muito generosa esta preocupação, aliás todos os participantes foram extremamente generosos em compartilhar um pouco destas canções, desta arte tão linda, que através deste material, chegará ao conhecimento de muitas pessoas, que poderão ver um pouco mais das facetas de nossa cultura brasileira.




segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Descobrindo as canções e histórias da Congada do Parque São Bernardo

Domingo, dia 26 de outubro de 2014, além de ter sido um dia de importância devido à eleição para presidência da república federativa do Brasil, foi um dia incrível na pesquisa para composição do livro. Fomos a casa de Dona Cotinha encontrar a família Lemes para conhecer algumas músicas da Congada do Parque São Bernardo. O pessoal foi chegando, se ajeitando para darmos início a bagunça e diversão, como disse o seu Zé Neguinho. Aliás, seu Zé começou cantando uma música linda que diz:



EU CHORAREI AMANHÃ
QUE HOJE EU NÃO POSSO CHORAR
O DIA É PRA GENTE VIVER
A NOITE É PRA GENTE SONHAR

Fomos devidamente apresentadas ao pessoal do grupo, para que todos pudessem entender o que é que a gente estava fazendo ali, aí seu Ditinho, mestre da congada, se coloca da seguinte maneira:


"DE VEZ EM QUANDO A GENTE TEM QUE OLHAR NO RETROVISOR SIM
ISTO FAZ PARTE DO PROJETO DA EVOLUÇÃO DAS COISAS
É UMA PENA QUE MEUS AVÓS, MEU PAI, NÃO TÁ AQUI PRA VER
QUE VALEU A PENA ELES ANDAR 4/ 5 HORAS PRA DANÇAR CONGADA
E ESTAMOS ENTRANDO NA INTERNET ESTAMOS ENTRANDO NO PROGRESSO
NÃO ESTAMOS FICANDO PARA TRÁS, ESTAMOS EVOLUINDO"

Nos enche de alegria pensar que de alguma maneira estamos contribuindo para que o trabalho da Congada do Parque São Bernardo seja eternizado e esteja disponível para as pessoas. Foi uma tarde incrível, onde tivemos a oportunidade de conhecer muitas canções, de ouvir histórias, de compartilhar emoções. Seu Zé Neguinho nos contou uma história muito interessante que aconteceu com o grupo certa vez em um encontro de Congadas no Estado de Minas Gerais:




NÓS ESTÁVAMOS NUM ENCONTRO DE CONGADAS EM MINAS GERAIS, ENCONTRAMOS OUTRA CONGADA E CANTAMOS ASSIM PARA ELES:

QUE ENCONTRO MAIS BONITO NÓS TIVEMOS NESSA HORA

ENCONTRAR FILHOS DE DEUS, FILHOS DE NOSSA SENHORA


AÍ OS CARAS PARA ZUAR COM A GENTE, PORQUE A GENTE NÃO CARREGA BANDEIRA, NORMALMENTE OS GRUPOS CARREGAM BANDEIRA DE SANTO, AÍ A GENTE NÃO CARREGA BANDEIRA, DAÍ FIZEMOS O ENCONTRO TAL, E OS CARAS COMEÇOU DAR RISADA , DO LADO DE LÁ, COMO QUEM DIZ, MEU HOJE A GENTE VAI PEGAR ESSES CARAS DE JEITO, PORQUE A GENTE, MODÉSTIA A PARTE, A GENTE SOMOS TOP DE LINHA, A GENTE CANTA, A GENTE DANÇA, RESPEITA TODO MUNDO, TEM UM PERFIL LEGAL, ENTÃO AS CONGADAS, ELAS NÃO TINHA ISSO, FICARAM MEIO P DA VIDA COM A GENTE, AÍ ELES CANTARAM ASSIM PRA GENTE, ELES SABIA QUE A GENTE NÃO TINHA BANDEIRA, ELES CANTARAM ASSIM PRA GENTE:

QUE ENCONTRO MAIS BONITO, NESSE PEDAÇO DE RUA

VOCÊ BEIJOU MINHA BANDEIRA, QUEREMOS BEIJAR A SUA

AÍ A NOSSA CONGADA RESPONDIA:

SÃO BENEDITO É O SANTO

SANTO QUE ME VALEI

ELE É MEU PADROEIRO

CADÊ O PADROEIRO SEU

QUE ENCONTRO MAIS BONITO NÓS TIVEMOS NESSA HORA ENCONTRAR FILHOS DE DEUS, FILHOS DE NOSSA SENHORA

SEU DITINHO TERMINANDO A HISTÓRIA...
TERMINOU DA SEGUINTE FORMA:  EU ALI NO MEIO PROCURANDO UMA SOLUÇÃO, NÃO ACHAVA, FUI NO ZÉ E O ZÉ ABRAÇADINHO COM O VIOLÃO TAMBÉM, O PAULINHO TAMBÉM COM O VIOLÃO ABRAÇADO,  E EU IA LÁ, FALAVA COM O LUÍS LÁ TRÁS, NA BATERIA TAMBÉM, O LUÍS FALAVA ASSIM: HOJE PEGARAM NÓS, E AÍ O ZÉ PEGOU E FALOU: PAI (O MEU PAI ANDAVA COM UMA ESPADA, DE LADO), AÍ O ZÉ FALOU PRO PAI: TIRA A ESPADA, AÍ MEU PAI BATENDO A MÃO NO BOLSO E AQUELE POVÃO, É MUITA GENTE NÉ, E AÍ FALOU E AGORA, E O PAI BATENDO A MÃO NO BOLSO, O QUE SERÁ QUE O PAI TÁ TIRANDO AÍ? DAQUI A POUCO MEU PAI TIROU O ROSÁRIO, ENFIOU O ROSÁRIO NA ESPADA E LEVANTOU ASSIM, E AQUELE POVÃO GRITOU Ê SÃO BERNARDO, AÍ PAI LEVANTOU, JESUS É MEU, EU SOU DE JESUS, JESUS VAI COMIGO, EU VOU COM JESUS 

Fala a filha do seu Zé:
QUER DIZER SÃO BENEDITO É NOSSO PADROEIRO E NOSSA BANDEIRA É O TERÇO  

SEU DITINHO: E O POVÃO, COMO É MÚSICA RELIGIOSA, TODO MUNDO COMEÇOU A CANTAR, AÍ O POVÃO FEZ AQUELA FILA, COM TANTAS CONGADAS, O POVO VEIO PARA BEIJAR O ROSÁRIO, O POVO COMEÇOU A FAZER FILA E O PAI COM A ESPADA, AÍ NO COMEÇO COMO O BRAÇO DELE  TAVA FIRME, FOI SEGURANDO A ESPADA, FOI 1, 2,3,4, VAI FICANDO BOM, MAS DEPOIS JÁ VAI FICANDO MEIO TRISTE, ENTÃO POR FIM QUEM CHEGAVA MEU PAI ENCOSTAVA A ESPADA NA TESTA DELE, QUE O BRAÇO DELE NÃO AGUENTAVA
CLÉO FALANDO: MAS FICOU PARECENDO QUANDO UMA PESSOA FEZ UM ATO MUITO GLORIOSO,  QUE ELES PEGAVAM A ESPADA ASSIM E BATIA NA TESTA ASSIM COMO SE A PESSOA TIVESSE FEITO ALGO MUITO GRANDE, NA ÉPOCA DOS GLADIADORES, O PESSOAL AJOELHAVA E RECEBIA, ACABOU FICANDO MAIS BONITO

A congada está no cerne da família Lemes há cerca de 120 anos e as novas gerações estão chegando para dar continuidade ao grupo, trabalhando dentro da realidade atual, mas nunca se esquecendo de se remeter e agradecer a quem deu início a todo este processo. Para finalizar o encontro, foi cantada uma canção de despedida:


EU AGORA VOU ME EMBORA
O LAIÁ, O LAIÁ
NÃO VAI DÁ PRA TE LEVAR
O LAIÁ, O LAIÁ
VOU LEVAR SAUDADES SUAS
O LAIÁ, O LAIÁ
NO CAMINHO EU VOU CHORAR
OLAIA, LAIA


BOA NOITE, BOA NOITE
MEU SENHOR, MINHA SENHORA
BOA NOITE, BOA NOITE
PORQUE NÓS JÁ VAMO EMBORA
BOA NOITE, BOA NOITE
MEU SENHOR, MINHA SENHORA
BOA NOITE, BOA NOITE
PORQUE NÓS JÁ VAMO EMBORA